Novos colunistas escrevem sobre gestão, inovação, empreendedorismo e estratégia
As empresas que operam no Brasil e os brasileiros que tentam abrir um negócio próprio enfrentam desafios que o país carrega há anos, como o de ter uma força de trabalho melhor preparada, desenvolver uma cultura de práticas sustentáveis e mais humana entre seus funcionários. E inovar.
Para debater esses temas, com foco em inovação, empreendedorismo, gestão e estratégia, o Valor vai iniciar na edição desta terça-feira uma nova seção. Seis colunistas, considerados referências em seus campos de atuação, escreverão às terças e quartas-feiras na página 2 do caderno de Empresas. As colunas também poderão ser lidas no site do Valor.
São eles Nizan Guanaes, estrategista da N Ideias Consultoria; Wellington Vitorino, diretor-executivo do Instituto Four; Viviane Martins, CEO da Falconi; Rony Meisler, CEO do Grupo Reserva; Flávia Camanho, fundadora da Flux Institute; e Carlo Pereira, CEO do Pacto Global da ONU no Brasil.
- Nizan Guanaes: “É preciso tirar um sabático todos os dias”
Os novos colunistas do Valor são unânimes ao afirmar que o brasileiro que administra uma empresa sabe driblar crises econômicas, pois já passou por várias. E consegue ser criativo quando o inesperado acontece, a exemplo dos efeitos da pandemia de covid-19, que acabou levando boa parte das companhias para canais digitais - para fazer reuniões com clientes, treinar funcionários e para vender seus produtos e serviços ao consumidor. Mas carece de uma força de trabalho melhor educada, de crédito mais barato, de um ambiente de negócios menos hostil, que ofereça, por exemplo, uma estrutura tributária mais simplificada.
A nova seção vai procurar responder questões sobre como aumentar e melhorar projetos de inovação
A nova seção vai procurar responder questões sobre como as empresas podem ampliar e melhorar projetos que têm por objetivo a inovação. Não é tarefa fácil. O Brasil, segundo dados mais recentes do Ministério da Ciência e Tecnologia, investiu 1,21% do PIB em ciência e tecnologia em 2019 - abaixo do que investiram Estados Unidos e Alemanha (mais de 3% ). E também abaixo de Canadá, Reino Unido, França, Itália e China. A Unesco também notou que o Brasil vem investindo menos em pesquisa e desenvolvimento (P&D) nos últimos anos e que o número de patentes registradas por empresas também vem caindo. Como o Brasil pode mudar esse cenário?
Para Nizan Guanaes, um dos publicitários mais prestigiados do país e consultor de estratégia de comunicação corporativa, “o que mais falta é um ambiente de negócios mais benigno, que destrave ainda mais as forças positivas” do país - um mercado interno grande e pessoas talentosas, de espírito empreendedor. “Isso passa por questões macroeconômicas e políticas de soluções complexas e lentas. Precisamos focar nelas, sem dúvida. Mas os empreendedores e as empresas não podem esperar, então eles precisam criar seus próprios caminhos e suas próprias estratégias”, diz Guanaes.
Investir nas pessoas é fundamental, afirma Pereira, do Pacto Global, iniciativa proposta pela Organização das Nações Unidas para encorajar as companhias a adotarem políticas de responsabilidade social e sustentabilidade.
“Precisamos quebrar o ciclo de não investimento devido à instabilidade de curto prazo. Como líderes empresariais, temos que investir mais nas pessoas e ter propósito claro para nossas empresas. Temos que ser atores importantes na transição para um país íntegro, inclusivo e regenerativo”, diz.
Viviane Martins, CEO da Falconi, consultoria especializada em gestão de empresas fundada por Vicente Falconi, observa que “quando se fala em inovação, vêm à cabeça de muitos os unicórnios de mais de US$ 1 bilhão, baseados em tecnologia e com serviços e produtos disruptivos. empre vale lembrar que o Brasil, com 15, é o oitavo país do mundo em número de unicórnios”. Quase empata com o Canadá, que tem 16. Mas ainda longe dos 170 da China e dos 500 nos Estados Unidos. Para a executiva, ser uma empresa inovadora passa pela digitalização do negócio, ferramenta que recebeu impulso durante a fase aguda da pandemia de covid-19, quando boa das companhias teve que migrar sua operação de canais físicos para digitais. Mas saber trabalhar os dados atrelados à operação é igualmente importante, observa a executiva.
O Brasil é um país de empreendedores, nem sempre por vocação - é preciso educar e facilitar o acesso a crédito
Camanho, especialista em desenvolvimento humano e governança familiar, pondera que para inovar, a companhia deve ter apetite para o risco. “A inovação tem que permear processos, produtos, pessoas e clientes. E o mais importante, talvez o ingrediente fundamental para que a inovação ocorra: aceitação dos erros. Em uma cultura que se propõe a inovar, as novas ideias devem ser ouvidas, testadas e as lições aprendidas.”
É verdade que a verba pública para pesquisa, para investimentos em ciência, caiu nos últimos anos no país. Mas também é verdade que boa parte das empresas não sabe como acessar esse tipo de recurso, quando ele está disponível. E isso, claro, não ajuda o país a inovar.
“A relação entre os investimentos nacionais e o Produto Interno Bruto do país nos coloca fora da lista dos protagonistas em inovação, é preciso lembrar que nem sempre as próprias empresas têm pleno conhecimento dos recursos públicos que poderiam usar para fomentar pesquisa e desenvolvimento. Levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI) com grandes e médias empresas indicou que apenas 10% tinham utilizado linhas de financiamento público voltados a P&D”, diz a CEO da Falconi.
Meisler, CEO de um dos maiores grupos de moda do país, o Reserva, pertencente à Arezzo & Co, diz que a instabilidade nas esferas econômica, política e jurídica é “nosso maior desafio”. E defende que empresa bem sucedida é aquela que consegue ter uma cultura forte associada a um capitalismo mais consciente. A empresa deve estar “preocupada não apenas com o ‘shareholder’, mas também com todos os ‘stakeholders’”, diz, referindo-se a colaboradores, consumidores, fornecedores e comunidades ao redor da companhia.
Assim, diz o empresário, “ganha a empresa, que cria seguidores em vez de consumidores, ganha o consumidor, que vive em um ecossistema mais justo e ganha a sociedade”.
O CEO do Pacto Global chama atenção para o desemprego. “O que faz o brasileiro abrir um negócio é a falta de emprego. Mais de 80% dos que resolveram empreender em 2020 precisavam fazê-lo para ganhar a vida, uma vez que empregos estão escassos. Por isso, temos que tomar cuidado para não romantizar o tema”, diz ele. Ao mesmo tempo, lembra que as pequenas e médias empresas são grandes empregadoras e que há muitos brasileiros com vontade de empreender. Mas “para viabilizar novos negócios, precisamos desburocratizar nossa economia, incentivar e capacitar quem deseja empreender”, diz Pereira.
“O Brasil tem um altíssimo número de CNPJ’s abertos e de pessoas abrindo seus próprios negócios, mas precisamos diferenciar o que é empreendedorismo de subsistência e empreendedorismo por oportunidade”, afirma o diretor-executivo do Instituto Four, instituição sem fins lucrativos que tem a meta de formar jovens para trabalhar nos setores público e privado, debatendo e desenvolvendo projetos para solucionar problemas que o país enfrenta.
“Temos muitos empreendedores no Brasil que abriram seus negócios não porque encontraram uma oportunidade de negócios, mas sim por não vislumbrarem outra opção. Por isso, acredito que o Brasil é, sim, um país de empreendedores, mas ainda em um estágio muito inicial”, acrescenta Vitorino, que chama a atenção para um fator fundamental para impulsionar o empreendedorismo: crédito.
“Um dos grandes mecanismos para o desenvolvimento dos países é a expansão do mercado de crédito: sempre que há crédito no mercado, os empreendedores podem se desenvolver e gerar mais empregos e renda para o país. Entretanto, no Brasil, há uma grande dificuldade de acesso a crédito para pequenas empresas, principalmente aquelas que são geridas por pessoas pretas, pardas e indígenas ou mulheres. Precisamos resolver este problema para desbloquear o desenvolvimento de nossos empreendedores”, diz Vitorino.
Mas, afinal, como o empresário ou o executivo consegue administrar bem o seu negócio? Para a CEO da Falconi, “a boa gestão não deve ser vista como um obstáculo ou um oásis que poucos atingem, mas um norte permanente e algo para qual todos podem se preparar”. Em sua visão, “saber para onde se quer ir e saber medir o esforço despendido para alcançar cada etapa do caminho, apoiado pelos resultados que traduzam de verdade o avanço naquela fase, são fundamentais para grandes, médios, pequenos e micros”.
Para a empresa que já está consolidada, o principal desafio para a liderança “é a mudança de cultura”, diz o CEO do Pacto Global, referindo-se à necessidade das companhias brasileiras adotarem compromissos em questões ambientais, sociais e de governança (ESG) - “esse é um grande desafio”, diz.
“O Brasil tem que escolher seu lado da história e o posicionamento e ação das empresas nesse momento é fundamental”, afirma Pereira.
“Temos falado e ouvido muito a sigla ESG, mas ainda há muito a ser trilhado no setor privado. As empresas que não se comprometerem por meio de compromissos públicos lastreados em metas baseadas na ciência em torno dessa agenda vão ficar para trás, ou simplesmente vão deixar de existir”, afirma o CEO do Pacto Global.
O executivo-chefe do grupo de moda Reserva defende que “o país deveria cada vez mais criar políticas sérias de financiamento e desburocratização para estímulo ao empreendedorismo”. O empreendedorismo, afirma, “é a matéria prima da inovação”.
O Brasil, observa o empresário, “é um dos países mais hostis do mundo para se fazer negócios. O custo Brasil é gigantesco. Portanto, quando vencemos aqui estamos concomitantemente preparados para vencer em qualquer país do mundo.”
Mas para prosperar no mercado externo, observa Meisler, “temos também que perder o ‘complexo de vira-lata’. Nos acostumamos a responder que ‘o Brasil é muito grande’ quando nos perguntam sobre planos de expansão internacional. Por outro lado, as empresas brasileiras que rompem com esse pensamento têm tido resultados espetaculares”.
Fonte: Valor Econômico